Quem pode atuar como seu intérprete no Reino Unido

Muitas pessoas acreditam que o trabalho de intérprete é algo simples, que pode ser desempenhado por qualquer pessoa que tenha um bom nível de inglês. Contudo, existe todo um treinamento, habilidades específicas e requisitos de caráter exigidos pela profissão.

Isso porque, além de conhecimento sólido das duas línguas, é necessário treinar vocabulário específico, lidar com situações de estresse, ter boa memória e comprovar idoneidade. Por conta disso, no Reino Unido, em contextos oficiais como a imigração, tribunais e hospitais, somente profissionais reconhecidos e autorizados podem atuar.

Assim, ainda que a pessoa queira e autorize, nem sempre é possível ser acompanhado de alguém que não preencha as credenciais exigidas, mesmo a profissão não sendo regulamentada. E acredite, isso é um cuidado com a enorme comunidade de residentes cujo inglês não é a primeira língua. Um intérprete muitas vezes não apenas fala, mas tem contato com informações sigilosas/sensíveis do cliente.

Caso você precise de um intérprete, segue abaixo o que será exigido:

  1. Antecedentes

    Pessoas que necessitam de intérprete são consideradas vulneráveis. Alguém que não fale inglês se encontra em suscetibilidade de sofrer vários tipos de abuso e exploração. Uma pessoa que atue com esse público no Reino Unido não pode ter ficha criminal e, dependendo do tipo de trabalho, também são vetadas pessoas passíveis a ser corrompidas e/ou que tenham ligação com criminosos. Isso vale mesmo se a pessoa em si não tiver antecedentes.

    Ao contratar um intérprete, é importante saber se a pessoa tem um Enhanced DBS check. Esse documento é o mínimo exigido por todas as agências e órgãos oficiais e é uma garantia de que a aquela pessoa não tem advertências policiais, condenações, investigações ou quaisquer questões que a impediriam de exercer trabalhos que a coloquem numa situação de poder sobre o outro. Esse documento pode ser salvo num sistema chamado update service, que atualiza automaticamente o atestado do profissional, de forma que é possível visualizá-lo online.

    Existem também outros certificados mais avançados. Um deles é o NPVV3, utilizado pela polícia. Pessoas que portam esse atestado foram submetidas a intensa escrutinação de seu comportamento online, contatos pessoais, pessoas da família (e da casa onde moram) e até mesmo perfil financeiro. O objetivo central é investigar não apenas os antecedentes da pessoas, mas também suas fragilidades em potencial justamente por causa do acesso a informações confidenciais. Um outro é o CTC, que permite ao intérprete atuar em casos high profile.

    Via de regra, um EDBS no update service é o suficiente para a maioria dos casos e recomendável mesmo que não seja uma exigência. Eu sempre faço questão de apresentar o meu a clientes particulares.

  2. Qualificações

    Conforme explicado acima, simplesmente falar inglês bem não é suficiente e em contextos como tribunais, polícia e imigração, onde o futuro de alguém pode ser seriamente afetado, a exigência é elevada.

    Para atuar em audiências, polícia, embaixadas, imigração e consulados é exigido um curso superior em interpretação (que tenha reconhecimento no Reino Unido) ou as qualificações DPI (Diploma in Police Interpreting) e DPSI Law (Diploma in Public Service Interpreting) e o DCI (Diploma in Community Interpreting) que são level 6 (equivalentes a uma graduação).

    Intérpretes portadores desses certificados comprovaram não apenas que tinham o conhecimento linguístico, mas também o conhecimento de temas técnicos complexos em ambas as línguas num nível que um nativo leigo não teria e capacidade de pensar e traduzir rápido e corretamente (consecutiva e simultaneamente), fazer sight translations, e traduzir textos escritos a nível acadêmico.

    Em casos menos complexos é possível utilizar um intérprete que tenha uma qualificação menos avançada, como o Community Interpreting level 3.

    No meu caso eu tenho o DPSI Law e sou full member do CIOL.

  3. Afiliação profissional

    A afiliação profissional é mais um nível de confiabilidade e comprometimento que o profissional assume e uma exigência de órgãos oficiais. Para representar clientes em nesses contextos, o intérprete precisa estar afiliado a uma agência (que seja reconhecida), ou a um conselho profissional e/ou ao órgão regulatório oficial.

    Os conselhos profissionais de intérpretes são o CIOL (Chartered Institute of Linguists) e o ITI (Institute of Translation and Interpreting). Todos os intérpretes desses conselhos são pessoas quem comprovaram experiência e/ou qualificações e se dispuseram a seguir um código de conduta. São pessoas que não poderiam simplesmente desaparecer do mapa sem deixar rastro (olha eu aqui completamente pesquisável!). Também temos o NRPSI (National Register of Public Service Interpreters) que é o órgão regulatório. Intérpretes registrados nessa lista precisam ter qualificações reconhecidas e um número mínimo de horas comprovadas de atuação em serviços públicos no Reino Unido.

  4. O que fazer

    Se você precisar ser acompanhado por um intérprete num contexto oficial como a Embaixada Americana, Home Office, UKVI etc, muitas vezes é necessário registrar no sistema deles que aquela pessoa acompanhará você com antecedência. Não adianta simplesmente aparecer com alguém lá e dizer que este será seu intéprete.

    Um detalhe importante que vale salientar é que muitas vezes em contextos de serviços públicos como audiências, delegacias e imigração, o próprio governo disponibiliza o serviço de intérprete gratuitamente; logo, você não precisa pagar. Tudo o que você precisa fazer é marcar no formulário ou dizer “I need a Portuguese interpreter”. O intérprete que atua nesses contextos é imparcial e trabalha em defesa da justiça facilitando a comunicação. E claro, todos temos um dever com relação ao Código de Conduta dos Intépretes que devemos respeitar.

    Caso você tenha dúvida, pergunte. Um profissional experiente com certeza conseguirá ajudar você a entender o que precisa ser feito.

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