6 formas de dizer “advogado” no Reino Unido
Há seis maneiras de dizer “advogado” no inglês britânico e, ainda que todas estejam corretas, temos diferenças relevantes quanto a quando e em referência a que profissionais usá-las.
Segue a dica:
Lawyer
Pode ser usado como um termo geral, referindo-se não apenas a quem tem qualificação e reconhecimento para atuar no Reino Unido, mas também indivíduos que o podem fazer em outras jurisdições. Tais profissionais podem trabalhar com consultoria - desde que não seja relativa ao direito interno - e representar clientes em diversos contextos no mercado britânico, muito embora não atuem como operadores do Direito no que diz respeito à lei do Reino Unido em si.
Aqui, os estudantes de Direito fazem um curso geral até o terceiro ano e em seguida escolhem se querem atuar fisicamente representando clientes em tribunais ou com quaisquer outras questões que não envolvam isso. Assim, o termo lawyer é utilizado como uma forma de englobar os advogados internacionais e também tanto os formados no Reino Unido para atuar exclusivamente com a parte contenciosa, comparecendo a tribunais quanto os formados para atuar nas partes instrutiva, consultiva e preparatório-processual do direito.
A tradução de lawyer, com isso, seria advogado. Caso isso seja mencionado num contexto que envolva profissionais formados no Reino Unido e fora, é bem possível que essa pessoa assim seja chamada por ter sido qualificada e ter permissão para atuar com o direito não-britânico.
Vamos a algumas especificidades:
Barrister
É um advogado com formação em contencioso. Isso mesmo. Após o terceiro ano do curso de Direito, o estudante que decide ser barrister deverá entrar para o Inns of Court e começar um treinamento chamado Pupillage. O próximo passo é então participar de uma cerimônia chamada Call to the Bar. A partir daí, tem-se a qualificação para atuar junto a tribunais, representando clientes.
Ao comparecer aos tribunais, barristers, assim como os juízes, normalmente usam perucas brancas feitas com pelo de cavalo e uma vestimenta na cor preta. Isso, contudo, pode não ser o caso, dependendo do contexto.
Sempre que devo interpretar e traduzir ou interpretar, atenho-me ao contexto. Se houver apenas um solicitor envolvido com o cliente, eu uso o termo advogado. Caso haja também um barrister, menciono que o barrister é um advogado de contencioso. Nenhum cliente tem apenas um barrister, mas é possível ter somente um solicitor.
Em contextos como conferências jurídicas, onde há mais liberdade para optar pela denominação, uso os termos em inglês com uma breve explicação em português e, dependendo de como a fala do palestrante segue, mantenho-os em inglês, sobretudo se se tratar de uma explicação sobre as diferenças existentes no Reino Unido.
E atenção à pronúncia:
Solicitor
Solicitor é um advogado com formação específica para atuar com questões jurídicas que não envolvam a representação de clientes perante um juiz. Há diferenças na forma como são treinados entre as nações que compõem o Reino Unido. Basicamente, solicitors lidam com a parte administrativa do trabalho advocatício, a interface com o cliente, a consultoria e instrução e a elaboração de peças processuais. Eu, como tradutora, tenho constante contato com eles em todas as fases do processo.
A decisão de se tornar solicitor ocorre após o terceiro ano de direito, quando o estudante deverá iniciar um Training Contract (contrato de trainee) num escritório. Muitas vezes, os solicitors podem ter Right of Audience, o que quer dizer que eles têm o direito de pleitear em nome de seus clientes nos tribunais. Tais solicitors são às vezes chamados de solicitor advocates.
Não há uma regra de vestimenta específica para solicitors. Eles podem ser tanto mais formais, quando atuantes no meio corporativo, ou mais informais quando lidam com pessoas físicas em contextos menos solenes, como o direito de família, por exemplo.
Atenção! Solicitor não pode ser traduzido como solicitador. A carreira existia em Portugal e tinha algumas semelhanças com o que um solicitor faz, mas há divergências no status e treinamento. Um solicitor não está numa categoria inferior a um barrister; sem eles nada pode acontecer num processo. Portanto, um solicitor é um advogado.
Ao traduzir ou interpretar, eu abro um pequeno parêntese/nota da tradutora caso seja necessário mencionar a questão da formação do profissional. Na maioria das vezes em que é relevante mencionar, o próprio autor/palestrante o faz.
Counsel
Este termo se refere a um representante legal atuante no contexto de uma audiência em curso. Pode estar relacionado a um indivíduo singular ou a um grupo de advogados que estejam militando em favor de cliente(s) naquela ocasião. O termo nunca é usado na forma plural e normalmente é acompanhado de um objeto: counsel for the prosecution/counsel for the defence/counsel for Ms. X/Mr. Z.
Ao traduzir/interpretar, counsel seria o(a)(s) advogado(a)(s) atuante em favor de/o(a)(s) advogado(a)(s) de… Ou ainda é possível usar termos como procurador constituído, mandatário ou outros que vemos por aí, desde que o contexto deixe claro que se refere a advogados em ação no momento em que estão no tribunal.
Advocate
Na Irlanda do Norte, Inglaterra e País de Gales, advocate é um defensor. É alguém que pode fornecer informações, conselhos ou apoio, ou ainda agir em nome de um usuário dos serviços públicos ou de sua família e até mesmo ingressar em juízo em nome do indivíduo. É uma pessoa que milita em favor de outrem ou ainda de alguma causa específica.
Um detalhe importante é que, em certos contextos informais como a justiça do trabalho, uma pessoa pode ser representada numa audiência por um advocate, que não necessariamente precisa ter formação em direito. Um advocate pode ser, por exemplo, um representante de um sindicato. É comum também que certos indivíduos, como membros da comunidade surda, tenham um advocate em contextos em que seus direitos e acessibilidade possam ser colocados em cheque.
Assim, para os três países advocate é o mesmo que defensor, representante, ou militante.
Já na Escócia, a coisa muda. Advocates atuam de maneira semelhante ao barrister, representando clientes em tribunais. A diferença maior é que eles fazem um treinamento diferente, cujo enfoque é a preparação para atuar em casos complexos junto a instâncias mais elevadas, como o Tribunal Superior Escocês (High Court of Justiciary). Dentre as etapas, estão um treinamento pago de 2 anos e mais um período de 9 meses de treinamento não-remunerado chamado devilling.
Saiba mais aqui.
Ao traduzir e interpretar, atenha-se sempre a qual dos países do Reino Unido a pessoa faz referência.
E lembre-se: via de regra, a Escócia destoa do restante e usa sua própria terminologia e diferenciações. Nem sempre será relevante traduzir ou interpretar isso.
KC/QC
No Reino Unido e em alguns países do Commonwealth, também há o título KC (King’s Counsel) ou QC (Queen’s Counsel), que seria algo como Advogado(a) do Rei/da Rainha. Trata-se de barristers (Inglaterra e País de Gales), advocates (Escócia) ou solicitor advocates que têm reconhecimento oficial por sua excelência no exercício da advocacia. Normalmente são advogados com alto grau de senioriade, contando com um mínimo de 15 anos de experiência e alta especialização em julgamentos.
Em casos de alta complexidade, eles têm o sole right of audience, o que quer dizer que ninguém mais pode representar clientes em audiências. Assim, em ações judiciais desse tipo, eles são o lead counsel (advogado principal), podendo atuar em conjunto com outros barristers e solicitors. A ideia é que no âmbito do processo, audiências menos complexas, como o pedido de relaxamento da prisão (bail) por exemplo, sejam feitas por barristers menos experientes, enquanto depoimentos e alegações finais sejam presididos exclusivamente por eles. Assim, como se é de imaginar, alguns desses profissionais são como celebridades do Direito britânico.
Espero que a informação tenha sido útil!